Afinal, comida sem veneno custa mais caro?
Segundo o Instituto Kairós, um orgânico num supermercado pode custar de 2 a 4 vezes mais caro. Aqui em Belo Horizonte, onde moro, já vi um maço de rúcula mirrado por R$12 e uma bandejinha de batatas por R$18, ambas embaladas em plástico filme e isopor.
Isso só acontece por que os grandes supermercados como Carrefour e Pão de Açúcar, por exemplo, fazem uma intermediação entre o pequeno produtor e o consumidor, então para manter a logística de um baita comércio desses funcionando, muita grana é investida com o pagamento de salários, transporte, energia elétrica, etc., afora que os lucros dos donos são enormes. O pequeno produtor na maior parte das vezes acaba com uma ínfima parcela paga pelos vegetais que demora meses para cultivar.
No livro “Donos do Mercado”, de João Peres e Victor Matioli, publicado pela Editora Elefante em parceria com o O Joio e o Trigo, lê-se que em determinadas transações contam com “quatro, cinco, seis intermediários entre quem planta e quem come”.
Existem algumas formas de comprar vegetais sem veneno mais baratos, fora dos grandes supermercados, mas antes disso, quero pontuar umas coisas, já que existe tanta confusão a respeito do tema.
Os vegetais sem veneno são direito ou privilégio num país onde há fome?
No manual “Segura Esse Abacaxi”, o Greenpeace alerta:
“As safras nunca foram tão grandes, ao passo que o futuro desta produção nunca foi tão incerto. O uso intensivo de agrotóxicos é a base desse modelo insustentável e desigual, que impacta a sua saúde e o meio ambiente. A conjuntura política atual torna esse cenário ainda pior. Agendas como a de direitos sociais e meio ambiente viraram moeda de troca barata para a permanência do presidente no cargo, mantida graças ao apoio da maior frente parlamentar do Congresso Nacional, a bancada ruralista. Há um extenso pacote de maldades negociado entre governo e ruralistas que atua nesse sentido: redução e extinção de áreas protegidas de floresta, paralisação das demarcações de terras indígenas, quilombolas e da reforma agrária, enfraquecimento do licenciamento ambiental, venda de terras para estrangeiros, anistia a crimes ambientais e a dívidas do agronegócio, legalização da grilagem de terras e desmonte da legislação de combate ao trabalho análogo ao escravo, entre outras iniciativas. Na linha de frente dessa ofensiva, está também o incentivo ao uso de mais agrotóxicos na produção de alimentos, resultando, invariavelmente, em mais veneno no nosso prato e de nossas crianças”.
Afora os problemas que o Manual aponta, o Brasil voltou para o Mapa da Fome devido às políticas de desmonte da segurança alimentar promovidas pelo governo Bolsonaro. Em fevereiro de 2021 – momento em que edito novamente esse post – estudos apontam que mais de 110 milhões de pessoa estão em estado de insegurança alimentar no país, e o número tende a crescer. Apesar do acesso aos vegetais sem veneno ser direito, essa não é a realidade de todas as pessoas no nosso país – muitos sequer têm acesso aos alimentos ultraprocessados, já que o preço da cesta básica só sobe…
Esses dados reforçam a importância de, para quem for possível, comprar alimentos agroecológicos ou com certificação orgânica, pois esse ato vai além de manter nossa saúde: é uma forma de fazer micropolítica e evitar que o agronegócio se fortaleça ainda mais. Se nós, consumidores, pudermos adotar vegetais sem veneno, criaremos uma demanda de mercado, e assim mais produtores serão beneficiados.
Foto da @diniloris
Tá, mas qual a diferença entre um vegetal orgânico certificado e um vegetal agroecológico não certificado, sem veneno?
Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), para que alimentos possam ser comercializados no Brasil como “orgânicos”, os produtores devem obter uma certificação que, em outras palavras, é o “selo de orgânico”.
Há a certificação orgânica por SPG (Sistema Participativo de Garantia), que decorre da organização dos próprios produtores com membros do Organismo Participativos de Avaliação da Conformidade Orgânica (OPAC´s). A certificação também pode se dar por Auditoria ou por Formação de Organizações de Controle Social (OCS).
Como o Brasil é enorme e há muita variedade de vegetais certificados, é possível achar vegetais orgânicos certificados por um bom preço (com raras exceções tais alimentos estão nas gôndolas dos grandes supermercados).
Já conversei com muitos produtores que não conseguem se organizar para obter qualquer tipo de certificação, seja por falta de verba, informação e outros muitos motivos. Por isso, quando você se deparar com alimentos que não possuem certificado numa feira formada pelos próprios produtores, por exemplo, minha dica é olhar nos olhos de quem plantou e perguntar como o cultivo aconteceu e, na melhor das hipóteses, visitar o local (pela minha experiência, geralmente a visita é tida como alegria!).
Sei que para muitos é impossível ter acesso aos pequenos produtores, seja pela situação social (local moradia, dinheiro, transporte, etc.), mas preciso contar que quando faço amizade com um produtor e me torno uma cliente fiel, seja comprando na feira ou pedindo cestas, além de aprender muito, crio uma conexão com o alimento a ponto de querer saber mais de perto como ele é produzido, tornando esse processo de compra muito mais prazeroso.
3 documentários sobre o perigo dos agrotóxicos
Para entender a importância dos alimentos orgânicos, sugiro que você asssista os documentários abaixo, que mudaram meu olhar sobre o consumo dos alimentos sem veneno:
– “O mundo segundo a Monsanto”
– “O veneno está na mesa” (existem 3 da mesma série)
– “Ilha das Flores” (esse é bem antigo, mas eu assisti de novo esses dias e amei a forma como ele aponta a necessidade da gente parar de consumir veneno).
O aumento do uso do agrotóxico no país
O Brasil é um dos países no mundo que mais usam agrotóxico e os maiores fornecedores de veneno são os EUA (Dupont e FMC), Alemanha (Bayer e Basf) e Suíça (Syngenta), sendo que esses países vendem muito mais do que consomem. Isso já diz muito, né?
A Juliana Gomes, do Comida Saudável Para Todos, é autora do podcast o “Jornal Do Veneno”, disponível em todas as plataformas. Há alguns anos atrás ela citou em suas redes sociais a Pesquisa da USP “Geografia do uso de agrotóxicos e conexões com a União Européia”, que mostra dados assustadores:
– 30% dos agrotóxicos usados no Brasil são proibidos na Europa
– O setor movimenta 7 bilhões de dólares por ano
– O Brasil é o campeão do mundo no uso de veneno
Esses dados apontam como a bancada ruralista, hoje presente de forma massiva no Congresso Nacional, trabalha facilitando a vida do agronegócio.
Se puder, plante 🙂
Afinal, como comprar vegetais sem veneno por um preço melhor?
- Frequente feiras. A lógica é simples: como já comentei antes, quando o supermercado faz a intermediação entre o produtor e você, obviamente ele sai lucrando por isso, o que não nos deixa a menor dúvida que vale a pena frequentar feirinhas. Se você não sabe onde fica a mais próxima de você, dê uma olhada no site feirasorganicas.org.br, que mapeou feiras em todo o país. Se você não encontrar uma na sua cidade, pergunte à Prefeitura.
- Olhe ao redor. Talvez você tenha algum vizinho ou conhecido com quintal em casa. Nesse caso, veja se ele está disposto a fornecer ou vender parte do que produz. No bairro onde moro existem algumas árvores frutíferas, e já aconteceu de achar amoras, pitangas e plantas comestíveis fresquinhas dando sopa!
- Quando for consumir alimentos certificados, prefira comprar fora dos grandes supermercados. Se possível, compre direto dos produtores!
- Crie um grupo de compras coletivas. Na última empresa que trabalhei, convenci meus colegas a formarem comigo um grupo de compra coletiva de vegetais. O produtor entregava as cestas por preço módico uma vez por semana na porta do trabalho, o que facilitava a vida de todos. O maior empecilho aos grupos de compra é a responsabilidade de quem participa, pois a gente precisa lembrar que o produtor vai se movimentar para cultivar e fazer as entregas, de forma que todos precisam estar realmente envolvidos no processo, senão fica difícil ir pra frente. Esses grupos são uma mão na roda, pois pelo que já conversei com muitos agricultores, eles têm dificuldade de divulgar seus produtos e até mesmo de participar de feirinhas por conta da logística. Se você não conhece ninguém que produz, passe a frequentar a feira mais próxima até achar alguém de confiança. Vale lembrar que as compras coletivas funcionam para outros ingredientes. Eu, por exemplo, já participei de grupos de compras de oleaginosa e cogumelos sem veneno.
- Procure associações ou microempresas que vendem cestas de vegetais sem veneno. Na minha cidade existem coletivos que reúnem agricultores familiares para fazer o trabalho de entregar as cestas. Essas são inciativas bem legais, mas certifique-se que o agricultor está recebendo uma parcela justa pelo fornecimento dos orgânicos, pois já tive notícias de lugares que pagam uma quantia mínima a quem planta, o que não é nem de longe uma economia saudável. Ao final desse post você encontra uma lista dos produtores de Belo Horizonte.
A taioba não é PANC em Minas Gerais, mas pode ser considerada PANC em outros estados
Ela é um planta que brota no meio do quintal de forma espontânea, incrível para branquear e fazer trouxinhas
- Procure as frutas feias. Desde que entendi que a padronização dos corpos atinge até os alimentos, passei a dar muito mais valor às “frutas feinhas” (hoje acho tudo lindo haha!). Se você compra nas feiras, provavelmente vai gastar menos se mudar o olhar sobre a forma da sua comida. Aliás, isso vale para supermercados, pois já vi grandes redes descartar alimentos que não estavam estragados (inclusive com certificação orgânica) por conta da casca simplesmente começar a escurecer, o que é um absurdo, né?
- Plante: se você tem condição de cuidar minimamente de plantas, existem verdinhos muito adaptáveis aos apartamentos. Segundo o agricultor urbano George Lucas, responsável por manter a Horta Da Cidade, é possível manter em apartamentos pequenos, onde o sol não é tão abundante, as seguintes plantinhas para usar no dia a dia como temperos: manjericão, alecrim, salsinha, coentro, tomilho e orégano, já que elas necessitam de cerca de duas horinhas de sol e água apenas uma vez por dia. Você pode plantar numa jardineira e mover de lugar para pegar um sol, caso seja preciso. Tenho uma amiga que coloca as plantinhas para tomar sol na janela do banheiro, pois esse é o único lugar da casa onde tem luz. Além disso, tendo temperos frescos como esses em casa, a gente usa só o que precisa, evitando comprar um molho enorme que muitas vezes é desperdiçado. Outra ideia é usar o jardim ou canteirinho do prédio ou condomínio onde vive para plantar, mobilizando os vizinhos para um mutirão, ou então procurar hortas comunitárias, que já existem em algumas cidades.
Esse aqui é o George, meu parceiro do Curso Cozinha Da Terra
Foto da Fernanda Villaça
Vegetais sem veneno em Belo Horizonte
Não conheço toda essa galera, mas listei mesmo assim para mostrar as muitas opções que nós, consumidores, temos para adquirir orgânicos de quem produz comida livre de veneno. Me ajuda a levar essa informação pra frente compartilhando esse post?
@armazemdocampobh (bora fortalecer o MST)
@ahortadacidade (compra no local, Bairro Santa Lúcia)
@csanossahorta
@organicosdasoliveiras
@danielnovaesch
@coopasbh
@sacolao.amazonas (eles informam quanto os produtores ganham!)
@sitio.bonobas
@projetovistaalegre
@hortaporta
@sitionatural
@coletivomujique
@amorehortabr
@fazendinhaemcasa
@rocaurbanabh
@hortifrutideliverybh
@docaminhante (cogumelos)
@redepelahorta
@roots_ativa
@darocabicuiba
@rocaurbanabh
@nucleolixozero
@fazendajapao
@casahorta
@emporiumdarocaorganicos
@xepanacaixinha (não orgânicos que iriam para o lixo)
@estanciadosorganicos
@organicodochico
@emporio_monjolos
@begreen.farm
@aflora.florestal
@caixafarta.com.br
@dahortaorganicos
Post atualizado em 03.02.2021
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